Amor, Ansiedade, cartas, Crônica, Cronicas 24/25, depressão, Minhas Crônicas, silêncio

Tudo que começa acaba

Vocês sabem que eu escrevo sobre coisas que sinto, na verdade não escrevo sobre o que sinto, mas sobre os sentimentos que não são meus e me atravessam em forma de escrita. Tem uns dias que os Fãs Clubes do Jão andam atravessando minhas redes sociais, e eu acabei mergulhando em informações sobre ele. Ele curte escrever cartas, então eu escrevi uma carta que até agora eu não entendi se é para ele ou não. 

Oi,

Tenho um monte de perguntas para te fazer…, mas não sei se tenho esse direito. 

Eu sumi…, e ao contrário dos contos de fadas não deixei pistas, me perdi no meio de uma floresta densa sem deixar lembranças ou migalhas para serem seguidas, me senti um pouco estúpido, não sei se alguém vai entender, mas eu precisava sentir tudo aquilo que tinha dentro de mim, precisava sentir tudo que eu era e parar de mentir, eu me escondi em um lugar que só eu conhecia, meu frágil castelo de cartas que me mantinha aquecido mesmo quando estava desabando.

Queria esquecer todas as coisas que me fazem chorar, queria dizer que tá tudo bem, mas ainda não tá, eu não sei se você vai entender, mas espero que entenda, aqui dentro de mim ainda passa um filme, um filme que quase ninguém conseguiu assistir, eu sempre me considerei um roteiro ruim de assistir de perto, faço coisas sem sentido, coisas que quase ninguém entende, sou um bom vilão das minhas histórias. Me falam isso quando apareço com algum machucado novo, eu sou realmente um bom vilão…

Às vezes me pergunto se eu me tornei tudo que queria…, me desenhei e redesenhei tantas vezes que me perco em que me tornei…

Desculpa se eu não fui um bom herói, mas eu não sei como arrumar esse roteiro, não sei o que tirar e o que colocar no lugar, ainda tenho medo de tudo que eu sinto e do que posso fazer com isso, eu ainda não me acho essa pessoa legal para qual você escreve cartas, mas eu juro que estou tentando me encontrar, tentando ser um pouquinho mais parecido com aquela criança que você conheceu… 

Eu ando lendo, mesmo que em doses homeopáticas, o que escreveu para mim, eu sinto vontade de chorar, eu choro, e acho isso bom, você enxerga alguém que ainda não sei quem é, tenho que te agradecer por isso. 

Queria te contar que aqui o tempo passa devagar e eu não sinto saudade de como o tempo passava rápido, ando chorando de saudade e também de medo, isso me machuca mais do que cura, não sei se no fim de tudo eu vou conseguir voltar e salvar o dia, ou se alguém vai vir e me salvar… 

Talvez eu não precise ser salvo, mas eu ainda quero que alguém tente, ainda quero me sentir importante, desculpa pelo pensamento egoísta, mas eu espero que com o tempo me perdoe, espero que minhas palavras ainda possam ser importantes, e mesmo que eu não seja mais o herói na sua parede, espero que você ainda possa ter um tempo para me ouvir falar da vida, mesmo que de forma triste. 

Eu queria ter tido mais tempo, ter construído uma fortaleza mais forte do que as cartas de baralho que cercam esse castelo, mas não deu tempo…, eu sempre achei que dava, e por isso demorei para voltar.  Meses são anos, e eu aprendi isso enquanto desabava por tudo que perdi…

É estranho olhar para tudo que passou, ainda carrego todos os arranhões da minha última queda, não me lembro das noites mais divertidas, tudo parecia meio entorpecente, os cheiros eram ambíguos demais e de repente todo mundo pareceu gostar mais dessa minha versão, queria me tornar essa versão, eletrizante, apaixonante, fugaz…

Sempre fui bom em me remontar… Fugir era algo que eu era bom em fazer, as quedas não me machucavam, os medos não me assustavam, tudo parecia bem guardado aqui dentro. 

Ainda sinto a adrenalina desses dias, ainda sinto os toques, mesmo não me lembrando dos rostos, eu não sei explicar quando tudo começou a desabar, foi rápido, uma montanha russa em queda livre, sem freio, sem aviso, me senti frágil demais, pequeno, inseguro, quebrado, culpado, era como se tudo tivesse voltado novamente, só que com mais intensidade. Tudo que eu sempre evitei apareceu ali diante de mim. 

Meu peito apertava a cada palavra solta, os assuntos pareciam desinteressantes e tudo que vivi parecia uma lembrança distante do que eu não consegui viver, de repente tudo pareceu um erro maior do que um acerto, é estranho, era tudo que eu sempre quis, mas agora me faltavam palavras para entender o que eu havia me tornado… 

Queria fugir novamente, mas minhas pernas pareciam presas, e eu fui obrigado a assistir tudo que eu sonhei passar em um filme bem diante dos meus olhos, senti dúvidas, senti culpa. Não consegui fugir para nenhum outro lugar que não fosse aqui… 

Eu desejava desaparecer, assim como outras tantas vezes, então vim parar aqui, nesse lugar tão seguro e ainda assim tão frágil, me perguntei se o mundo era mais bonito do alto da torre de cartas, mesmo me achando incapaz de a escalar, sempre tive medo do que eu iria encontrar por lá, tive medo de gostar do silêncio, de desabar as cartas no meio do precipício e de gostar da queda. 

Meu coração ainda dói, parece que caí de lugares ainda mais altos, tenho dias bons e dias nem tão bons assim, a vida de todos pareceu andar tão bem sem mim, sinto medo de voltar e não me encaixar mais naquele lugar, eu ainda lembro dos risos e dos abraços, das palavras e dos afagos, mas tudo parece tão distante, que já não sei quanto tempo passou. É, o tempo passa realmente devagar aqui. 

Eu não sei se mudei, sei menos do que sabia sobre mim, eu ainda sinto vontade de me esconder, mas parece meio inevitável voltar, me olhar já não é algo tão assustador assim, já consigo me ouvir sem querer me esconder.

Os dias aqui tem cheiro de saudade, são quentes como um fim de tarde no Arpoador, às vezes são coloridos, barulhentos, mas outras tantas são cinzas, repetitivos, um loop enjoativo que me lembra de tudo que não volta mais. Nesses dias, a dor é mais forte e parece que nada vai fazer passar…, eu sei que vai passar, nesses dias eu não preciso de nada além de abraços quentes e silêncio. 

Eu voltei a escrever igual quando eu era criança, sabe, me sinto feliz com isso, não é algo bonito de se ler, mas ainda assim me sinto feliz… 

Me pergunto como o tempo anda por aí? se seu coração se acalmou ou se o tempo fez tudo ficar ainda pior?

Será que você sente o mesmo que eu senti?

Será que também já quis fugir no meio de uma tempestade? 

Será que já se afogou enquanto chorava lembrando de tudo que passou. Será que correu descalço, pisando em pedras, enquanto ouvia o coração gritar que deveria ficar mesmo que em migalhas?

Se você me fizer essas perguntas, não saberei responder, aqui tudo tá igual, mas também tá diferente, acho que aprendi a respirar com um pouco mais de calma, aprendi a ouvir meus gritos e a aceitar ajuda para secar minhas lágrimas. Ainda dói enquanto corro e por vezes parece que não tem ninguém que me entenda, às vezes tenho vontade de fugir para mais longe, mas não posso. 

Sentir é ruim para um caramba, dói, mas dói ainda mais não sentir nada. Continuo um filme bem ruim de assistir, mas agora ao menos eu ofereço pipoca para quem aceitar ficar, sei lá, pode parecer uma piada ruim, mas é quem eu sou e talvez eu não seja tão ruim assim.

Amor, cartas, Crônica, Cronicas 24/25, Minhas Crônicas, silêncio, término

We were right till we weren’t


Tudo é transmitido o tempo todo: o amor, a angústia, a traição. Logo as feridas ficam expostas e exigem de si uma reação imediata, como se sua dor fosse plástica, moldável aos anseios de quem te assiste. 

Para todas as pessoas que atravessam o caminho de quem sofre com um término, fiquem, acolham e abracem, não julguem, nada termina ou começa naquele ponto final. 


Terminar é um verbo muito difícil de ser conjugado sózinho e mesmo com a casa tão cheia eu ainda me sinto sózinho.

Ainda escuto o som daquela voz, me dando desculpas para conter meu riso, ainda sinto o toque de quem limpa minhas lágrimas após me fazer chorar, ainda o sinto por perto mesmo estando longe. 

Antes do fim eu me questionava se eu deveria ou não desistir desse nó que éramos nós, mas tudo se apagava quando você aparecia, me trazendo flores, falando sobre como eu me sentia, me fazendo sentir, como se ninguém mais me entendesse. 

Talvez ninguém realmente entenda!

Eu pensava que era minha culpa, achava que você me entendia, que todos os deslizes eram causados por meu desencaixe. 

Tudo dentro de mim sempre doeu, você sabia disso, falava que tudo estava bem, que estaria sempre aqui, era uma mentira que eu precisava acreditar. 

Agora dói ainda mais.

Tudo que sempre foi meio bagunçado, agora parece pior

Fico revisitando cada palavra, cada gesto, cada ausência, não é que eu nunca soubesse, é só que era difícil aceitar.

Me sinto sozinho, mesmo com todos em minha volta.

Uma angústia sobe com os soluços, meu pranto me rasga por dentro, me engasgo, a garganta dói, o peito aperta, me sinto pequeno, sózinho, o medo aumenta, me culpo, me questiono:

Por que deixei isso acontecer?

Por que eu sou assim?

Por que é tão difícil esquecer?

Eu queria que me respondessem o que fiz de errado. Se eu fiz algo de errado. 

As conversas de repente passaram a ser sobre mim, não gosto de ser assim, porque é tudo que sempre tentei evitar transparecer. Todos parecem saber tudo sobre mim, quando nem eu sei. Talvez possam me dizer onde errei, o que tenho que fazer para parar de doer.

Me sinto frágil, talvez eu tenha nascido quebrado, ou talvez tenham me quebrado tanto que agora pareço ser incapaz de remendar meus cacos. Será que existe uma super cola para isso?

Não sei onde comecei a estilhaçar-me, mas olhar para todos esse caos é como não me reconhecer.

Me machuco enquanto tento caminhar sozinho. 

Não para de doer.

Eu sinto cada parte de quem eu sou fugir de mim, ficar pelo caminho.

Quero fugir, fugir de tudo, de todas as conversas, de todos os abraços, de todos os olhares…

Não quero ter que dizer coisas boas, eu não consigo, não há nada de bom para ver aqui.

Procurei minhas roupas e encontrei lembranças. 

Minhas memórias não eram só minhas, e por mais que todos digam que é só apagar, é impossível.

Eu queria dizer que tudo sempre foi bom e que por isso não me importo com as lembranças, mas é mentira.

Talvez a maior mentira tenha sido escrita por mim, eu aceitei, sempre aceito

Dizem que dentro de mim há muita intensidade, que não consigo controlar o que sinto, mas eu controlo, eu tento controlar, tudo fica aqui dentro, guardado, tenho medo que se cansem das minhas palavras.  

Tudo ainda tem aquele cheiro, aquele gosto e ainda sinto aquele toque e isso é como caminhar em um campo minado, parece que tudo que sempre segurei vai explodir a qualquer instante. Não acho que alguém seja capaz de desarmar essa bomba que se encontra no meu peito.

Não quero conversar, não quero falar sobre aquilo que todos já sabem ou ter que contar o que não sabem, não quero ter que sair do lugar seguro que criei para não me machucar mais.

Me sinto uma criança fugindo da tempestade escondida dentro do armário, não quer ter que abrir essa porta. 

Talvez isso seja só o reflexo do cansaço de quem se acostumou a sorrir em concordância, dizer sim mesmo querendo dizer não, não consigo esquecer e esse sempre foi o problema, eu deveria ter gritado quando tive chance. 

Eu prometo que vou tentar apagar tudo, que vou tentar sorrir, que vou tentar fingir estar bem, mas por enquanto eu não consigo, tudo parece desmoronar aqui dentro e é só isso que tenho a oferecer por enquanto. 

Ansiedade, cartas, Crônica, Cronicas 24/25, depressão, Minhas Crônicas, silêncio

Era uma vez eu no meio da vida

Para todas as pessoas que se sentem pequenas e perdidas em meio ao mundo. 

Era uma vez um menino, ele nem era tão pequeno assim, queria abraçar o mundo, gostava de abraço apertado e conversas no silêncio, sua existência era peculiar, tinha cheiro de saudade e abraços tão aconchegantes quanto a areia da praia. Às vezes ele era céu azul outras tantas tempestade… 

Dentro da sua cabeça existia uma guerra interminável, uma avalanche de palavras que vez ou outra causava um desmoronamento em suas certezas. Quanto mais ele corria, mas aquele eco lhe perseguia, ele tropeçava, caía e se machucava, se machucava sem ninguém ver, secava às lágrimas e continuava a seguir mesmo machucado. A guerra dentro da sua cabeça era barulhenta, e talvez por isso ele tenha aprendido a viver de silêncios. 

Não que ele gostasse do silêncio, pelo contrário, o silêncio incomoda e é dolorido, ele prefere a casa cheia, mesmo que isso também signifique ficar com seu coração vazio. Era uma sensação de ter o sol no inverno, não era suficiente, mas era o necessário, isso bastava. 

Talvez ele nunca tenha se achado suficiente, o que é muito estranho, afinal, ele sempre foi tão cheio de certezas, sempre foi colo e abrigo, como podia não se achar suficiente? É, mas ele não se achava, pelo contrário.

O mundo mundo parecia não o compreender e isso fazia com que aquele menino que parecia tão pequeno crescesse muito rápido, mas era momentâneo, logo ele se sentia pequeno novamente, as palavras doíam, ele não entendia, machucavam mesmo sendo desconhecidos, tudo se misturava dentro de si e ele se perdia em tudo que sentia sobre si mesmo.

Pequenas palavras sempre foram guardadas no dicionário da guerra que existia em sua cabeça, por isso ele detesta jogos de palavras, ele guardava cada verso fora do compasso, cada história mal contada e cada resposta atravessada, é nessas horas que sua cabeça iniciava a guerra, refazendo cada momento como se ele por milagre pudesse ser mudado, era torturante e desgastante. 

Se sentia perdido, brincava de pique sózinho na esperança de alguém o encontrar e ouvir tudo que ele tinha para contar. Ele queria gritar, queria explicar o que estava acontecendo, tudo parecia tão óbvio, mas não era, era difícil buscar tantas palavras, os desmoronamentos aconteciam com frequência dentro de si.

Constantemente respondia que sua cor preferida é a que o céu tem. O mesmo céu que ilumina as tardes frias, é o que causa tempestades devastadoras, e bem, esse menino tem tempestades devastadoras dentro de si, tempestades que ele nunca soube quando começavam ou terminavam. Nunca soube definir o que sentia, talvez se ele tivesse a cor do céu fosse mais fácil. 

Queria que soubessem que seus dias não são só de sol, nem sempre são quentes e aconchegantes, que seu sorriso às vezes é bem enevoado e que suas tempestades acontecem mesmo quando tudo é parecido com uma tarde de verão.

Não tinha como controlar, se sentia culpado por isso, ele passou a ensaiar sorrisos, não que ele não quisesse ficar ali perto de todos aqueles abraços e risos, se sentia triste por não se achar suficiente, passou a sufocar tudo que sentia e sorrir, um riso nublado e incômodo que lhe tira o ar. 

Talvez ele já não soubesse conjugar os verbos: amar, sorrir e viver. Ele apagava constantemente sua conjugação em nome do que ele achava ser o certo para os outros. 

Cultivava o amor, tal qual um florista que insiste em cuidar das rosas sem luvas, se espetava com espinhos e não cuidava dos machucados. Era a única forma de amar que ele conhecia, uma forma dolorida, que escondia o choro mesmo quando visivelmente estava magoado.

Tudo que restava a ele era a busca incansável por alguém que ficasse e entendesse seu silêncio, que não o fizesse sentir um incômodo, que afastasse de si todas as palavras que insistiam em ser repetidas na sua cabeça. 

O peito doía, o corpo amolecia, ele não conseguia sobreviver sem os abraços, tudo cheirava a saudade mesmo com todos ali, se sentia culpado por sua tempestade invadir outros abraços, sentia medo das pessoas cansarem e irem embora sem avisar. Era como ser um passarinho na gaiola, ele não podia voar e seu canto era limitado.

Sempre foi mais fácil lançar palavras para desconhecidos, eles vão embora e não significam nada, mas os conhecidos, esses, ele tem medo de perder, e por isso sobrevive de silêncio, falando o que querem ouvir, sorrindo quando queria se esconder.

Era uma vez um menino, ele nem era tão pequeno assim, sobrevivia das grandes tempestades que existiam dentro de si, vivia dos abraços no acaso e de risos tempestuosos, mas o que ele não sabia é que mesmo com toda a tempestade dentro de si, ele ainda é capaz de produzir dias quentes, quando ele descobrir isso, talvez o medo de deixar suas palavras voarem comece a ir embora…

Ansiedade, Crônica, Cronicas 24/25, silêncio

Quando o carnaval passar…

Para todos aqueles que criam um outro “eu” para se protegerem das tempestades, eu sei que ai dentro é vazio e parece que ninguém entende, respira, tem sempre alguém que vai te reconhecer no meio da tempestade e abrigar teu coração em meio a um abraço acolhedor.

Quando o carnaval passar

Vamos dançar

qualquer coisa é melhor que tristeza

(Cícero – Laiá Laiá / Canções de Apartamento)

A purpurina se espalhou com tamanha facilidade, as serpentinas estavam por todo canto, as músicas saiam automaticamente enquanto você reconhecia outras línguas, mas estranhamente se sentiu vazio, as pernas se cansaram, se sentou no chão, tudo rodou, não conseguia sorrir, ninguém pareceu ligar, o bloco seguiu e você ficou. 

Ficou… 

O vazio parecia ecoar mais forte…

Doía o ouvido, a cabeça rodava, algo se entalava na garganta, um cheiro amargo incendiava suas narinas.

Ninguém parecia sentir aquilo…

Se sentiu deslocado, machucado, magoado. 

Queria entender o que faltava dentro de si. 

Tentou se levantar e caminhar, mas tudo parecia rápido demais, respirou como se seu mundo dependesse disso, mas algo dentro de si desencaixou, foi um desencaixe barulhento mas ainda assim oculto por todo barulho da cidade.

Um choro amargurado surgiu, os soluços saíam em meio a tempestade que parecia cair sobre você, era vazio mesmo com tanta gente ali, a purpurina escorria misturando-se ao suor, quis fugir, mas não conseguia saber como voltar.

Se sentiu perdido.

Os olhos pareciam não acompanhar toda aquela movimentação.

Atravessou a avenida colorida, tropeçou nas garrafas espalhadas, caiu entre os papéis coloridos.

Se machucou mais do que já estava machucado.

Não havia sangue ou algo que foi ralado, mas doía, doía tanto que a dor te guiou sem nem perceber, mesmo não reconhecendo o caminho, você chegou.

A porta parecia aberta, como se alguém tivesse abandonado o lugar às pressas.

Não reconheceu o lugar que deixou, mesmo que o endereço fosse o mesmo, mesmo que nada parecesse ter sumido.

Estava tudo fora do lugar, empoeirado, as certezas escondidas pareciam ainda mais escondidas dentro dos armários bagunçados. 

Sentiu o cheiro da saudade de um tempo que não voltava, comprimiu o ar, encolheu o corpo, sentiu frio.

Arrepiou a coluna, mordeu os lábios, engoliu as lágrimas. 

Não se lembrou da bagunça, não se lembrava de nada, o vazio aumentava, o choro ganhava força em meio ao silêncio que ecoava ali.

Era vazio, frio e silencioso, seus pensamentos pareciam dar eco.

Uma mistura de medo e agonia apoderou-se de você.

Tentou fechar os olhos, mas descobriu o medo de escuro e de toda a solidão ali representada. 

Tentou caminhar devagar entre os destroços, paralisou se dando conta de que não conseguia sozinho, era impossível se reconhecer ali, quis gritar, se desesperou, tudo estava diferente.

Se olhou no espelho, não reconheceu o reflexo ali, a dor aumentou, o vazio ecou e o espelho se quebrou. 

Eram tantos de você, ali espalhados naquele chão frio que você se escondeu. 

Tropeçou.

Se machucou.

Gritou.

Tentou se levantar e se perdeu em si mesmo, nas lembranças, nos sorrisos em lágrimas.

Lembrava-se vagamente que nas primeiras vezes tentou falar o que sentia, mas não foi suficiente, te pediram sorrisos e você sorriu, pediram para ficar e você ficou, te pediram para ser quem não era, e você fez. 

No começo não fazia tanta diferença, mas depois começou a caminhar no automático, respirou a fumaça dos seus sonhos incendiados entre as palavras não ditas e as lágrimas que secaram antes de cair. 

Você seguia por linhas retas mesmo que quisesse fazer curvas.

Seguia por caminhos conhecidos para não desconfiarem do que restou de si, para se proteger e manter aquela parte desconhecida protegida de tudo.

Mas não deu certo, você brincou durante tanto tempo de pique esconde com si mesmo que não se reconhecia, não entendia o choro, não conseguia guardar os sentimentos nos lugares, não acompanhava os próprios passos porque não tinha para onde ir ou para o que voltar, era como se embriagar na incerteza de nunca ser quem deveria ser. 

Não havia jeito de voltar a ser o que era e a você bastava apenas ser quem realmente era.

Ansiedade, Cronicas 24/25, silêncio

Suficiente

Eu ainda não entendi muito bem como a morte do Liam bateu em mim, não era fã da banda, não acompanhei a carreira solo, eu seguia umas páginas de fãs, mas era só isso. De alguma forma a morte me pegou de um jeito diferente do habitual e isso foi muito estranho, talvez eu esteja ficando velha demais para olhar para o mundo da mesma forma e dizer “tá tudo bem”.

Quanto mais eu curtia coisas sobre ele, mais apareciam, então mesmo que eu não soubesse nada sobre suas relações, amigos, ou do tempo de banda, agora eu literalmente estou inundada de informações que não me fazem bem.  

Eu sou uma pessoa que apesar de bem racional, consigo ser sensível à dor dos outros e perceber que esse rapaz se doava tanto e tinha tantas dores é algo complicado de assimilar. Meu pensamento mais irracional do dia foi: “Caraca, alguém podia ter aparecido, será que ele sabia que era tão amado?”

Dedico esse texto aos corações que sentem e se doam demais, que precisam gritar para serem ouvidos… vocês foram suficientes e necessários…


De repente tudo desabou, 

não houve um único aviso de que as paredes iriam ruir. 

Eu realmente queria receber um aviso sobre isso, foram tantos dias de paz, foram realmente bons, pude respirar sem engasgar com todos os meus pensamentos. 

Às vezes me pergunto o quão fraco eu fui, eu não corri quando percebi que tudo desabaria, eu não gritei alto suficiente por socorro, será que alguém realmente ouviu? Será que se ouvissem viriam me socorrer? Eu não sei, nada parece fazer sentido no momento, eu desabei junto com essas paredes e agora só posso esperar pelo fim. 

Não queria que o meu mundo fosse um grande álbum de fotografia, onde reviro as páginas e percebo mudanças em todos menos em mim. Eu passei a colecionar sorrisos, que não eram meus. 

Eu me importo demais, me importo com o tamanho dos sorrisos, com o aperto do abraço, com as palavras soltas, eu queria não ser egoísta, mas eu queria que houvessem feito o mesmo por mim. Queria saber gritar na direção certa, queria entender como o mundo funciona, queria não me sentir como me sinto, queria não ter confiado tanto e ter dito mais não do que sim, eu não me arrependo, eu tentei, eu acho que tentei…

Não acho que o mundo é justo, me desculpem mas não acho. Acho que eu vivi bons momentos com pessoas boas, durante um tempo as fazer sorrir me bastava para ter felicidade, mas depois passou a não ser suficiente, tudo parecia doer demais, fazer sorrir era tudo que me restava para ser visto. Ainda não sei se isso foi suficiente para ser lembrado, mas foi suficiente para me fazer dormir. 

Queria ter lido todos os livros da minha estante, ou ter ligado para todos que me falaram “eu te amo”, queria que a sensação de que tudo ficaria no lugar fosse verdadeira, mas ela durou tão pouco que me sinto preso dentro da minha cabeça, dentro de todas as expectativas que eu quebrei, não sei de devo me desculpar, não sei se me sinto culpado, eu não sei de nada.

Não entendo porque a paz não pode durar por mais tempo, por qual motivo tudo não pode ficar como era antes. Eu nunca fiz o suficiente para evitar que tudo desabasse, talvez eu realmente fosse fraco, talvez eu devesse parar de tentar ser suficiente, talvez eu devesse me conformar com tudo que o mundo me oferece, mesmo sendo tão pouco. Será que eu não mereço sorrir por conta própria? Será que tudo que me basta é tão pouco? 

Antes de tudo ruir eu senti o cheiro do cimento misturado a água e um vazio alcançou meu peito, era o início de tudo que eu nunca terminei. Eu detesto que tudo tenha que ser tão melancólico, mas eu realmente sinto falta de tudo que um dia eu fui. 

Mesmo quando me falam que eu continuo o mesmo, eu não acredito, não posso acreditar, o mundo mudou, as pessoas mudaram, nada ficou no lugar, incluindo meus pensamentos, meus sonhos e meus medos, tudo se intensificou. 

Eu queria alcançar a lua e conquistar o mundo, um dia eu realmente achei que isso seria possível, eu queria parar guerras e fazer lágrimas se transformarem em sorrisos, sério, pode parecer infantil, mas eu sempre quis ser lembrado por tudo que fiz, não importa se tudo desabar, mesmo não tendo conquistado planetas, alcançado a lua ou desarmado o mundo, pelo menos consegui secar algumas lágrimas. Isso agora parece bem pouco. 

Ouvi o primeiro “crec”, o segundo, e o terceiro, foi rápido, certeiro, tudo veio a baixo, senti que meu coração parou, ficou escuro, foi difícil respirar. Não me lembro quando foi a última vez que isso aconteceu, mas toda vez que acontece parece que fica mais forte e mais difícil de levantar, sempre acho que vai ser a última vez. 

Quanto mais eu me afundava, mais eu desacreditava de mim mesmo e acreditava nas coisas que diziam sobre mim. Os sorrisos já não me bastavam, os abraços me faltavam e tudo que queria era me esconder; 

Eu não deveria estar aqui, não deveria sorrir ou me aproveitar desse lugar. 

Eu não queria ouvir, eu quero me desculpar por toda preocupação causada, pelas ligações não atendidas, por todo o silêncio causado, eu queria me desculpar por tudo que eu quis ser e não fui.

Eu não consigo acreditar quando dizem que sou bom, que sou realmente bom, porque tudo que ecoa, é que não sou suficiente. Eu constantemente me pergunto por qual motivo insisto. 

Quando tudo fica escuro, quando todas as paredes parecem pesadas demais eu me esforço para escutar, para procurar o mínimo sussurro de “eu te amo”, para sentir os abraços e enxergar os sorrisos, e isso me basta, não sei por quanto tempo, mas me basta. 

**Eu escrevi esse texto ouvindo One Direction, eu nunca ouvi de forma consciente essa banda…

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Certezas incertas

Eu escrevo sobre pessoas e silêncios, eu não sei para quem escrevo, mas fique bem. Que Gonzaguinha possa nos inspirar a seguir a vida, provando seus sabores, docês ou amargos…

Eu não sei quando começou, mas não sei se quero descobrir, não sei de muita coisa a muito tempo, é tudo muito confuso dentro de mim, não entendo como todas as minhas certezas se converteram tão rápido em dúvidas capazes de me tirar do chão e me arrancarem o sono… 

Não foi repentinamente, sei que não foi, mas eu conseguia esconder tão bem, conseguia ignorar tudo aquilo que me incomodava, conseguia esconder tudo que eu sentia, conseguia criar justificativas que aquietavam meu coração quando alguém me decepcionava, mas agora, agora parece que tudo transbordou de uma forma que eu não consigo explicar. 

A angústia e a incerteza tomaram conta de tudo em mim, minhas ações tão rotineiras passaram a me atormentar, passei a repassar cada passo do meu dia durante a noite. Eu tentava entender o que poderia ser feito para que aquela dor passasse, para que o sentimento de “faltar algo” fosse logo embora, mas nada adiantava. 

Nunca fui assim, sempre foi tão mais fácil separar tudo e colocar em caixas, eu nunca precisei de explicações e nunca me senti obrigado a dar explicações, mas de repente tudo pareceu desencaixar, e tudo ficou uma bagunça, eram sentimentos complicados, coisas que eu nunca precisei lidar agora pareciam me incomodar. 

Eu nunca precisei apagar o que eu sentia por conta de ninguém, mas agora não sabia lidar com tantos olhares, com tantos apontamentos, mesmo que eu parecesse certo, mesmo que minha verdade fosse algo tão lúcido, ainda assim, agora tudo parecia dúvida, e eu não conseguia lidar com aquela angústia que surgia sempre que algo por menor que fosse surgisse dentro de mim para me questionar.

As vezes realmente agradeço por não ligarem, mas outras vezes eu penso que seria tão melhor se perguntassem sinceramente o que acontece aqui dentro, sei lá, eu só queria ter uma resposta, eu só queria que alguém ficasse ao meu lado até eu finalmente ter essa resposta. 

Mas não acontecia, e eu precisava seguir sozinho, seguir meu caminho e me concentrar em meu silêncio, ir e voltar de lugares antes tão conhecidos começava a se tornar uma tarefa difícil, um medo surgia no meio do caminho e eu não conseguia me livrar dele até finalmente voltar para casa, era como respirar uma fumaça sufocante e ainda assim ter que continuar até encontrar uma saída.

Eu juro que não sei quando começou, mas tudo parecia sem graça e meu peito doía só de me imaginar ali, repetindo insistentemente algo que eu não queria, era como ser um robô, eu não me reconhecia ali, mas era incapaz de sair. Eu até queria fugir, me esconder como quando era criança, não entendo como começou, mas era como entrar em um transe e fazer tudo no automático, era como criar uma outra pessoa. 

Era como me travestir de medos para sair de casa, parecia que todos me conheciam, mas ninguém realmente sabia algo sobre mim, não sabiam meus gostos, meus medos e meus sonhos, tudo em mim é confusão mas ninguém parece ligar para isso. 

É, eu realmente criava uma outra pessoa, uma que não precisava lidar com tudo que sentia, com minhas dúvidas, com o choro engasgado na garganta, com medos… Essa pessoa que criei era feliz, e raramente expressava o que sentia, não me reconhecia ali, mas era tudo que me restava para manter a sanidade. 

Depois de tudo acabar, é como se um pedaço tivesse ido embora, um pedaço que leva junto toda a minha respiração. Um ar estranho ocupa minha garganta e me impede de falar, meu silêncio acontece quase que naturalmente, não sei como reagir, respondo o que querem ouvir, sorrio, um sorriso que não reconheço, é como se não percebesse o mundo à minha volta.

Cada passo que dava, era como cair na realidade, era um mergulho em um mar revolto, me afogava sem entender os motivos, os soluços vinham sem perceber e me lembrava de tudo que trazia angústia, eu não entendo como aconteceu, não mesmo, mas ainda assim aconteceu. 

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Detalhes ínfimos

ínfimos: Excessivamente pequeno; diminuto; diz-se do tamanho, dimensão, força, quantidade, volume ou peso muito pequeno

Não existe nada pior do que cheiro de saudade, respirar em meio a certeza de que nada vai dar certo, era assim que se sentia, respirar era como retirar pedras atoladas do pulmão, dói, é tudo tão desesperador que se demora a entender que aquele é de fato o fático fim, chorar não adianta, gritar também não, você não consegue se esconder porque em todos os lugares tudo te lembra dessa dor eminente que se alojou em seu peito e te faz sentir como em um desmoronamento. 

Você viu os sinais de que tudo iria desabar, primeiro viu as rachaduras, depois o rastro de terra nos cantos das paredes, mas se sentiu paralisado e apenas assistiu a tudo ruir, tentou manter os olhos fechados, mas era impossível, o barulho, os gritos, o desespero e o cheiro de terra molhada invadiram seus sentidos e te sufocaram, era como ter uma vida inteira passando diante dos seus olhos enquanto tentava buscar por ar. Era difícil ver o mundo se esvaindo diante dos seus olhos, era difícil ver um mundo de amor ser transformado em saudade. 

Amar sempre foi um verbo conjugado de forma tão plural por você, amava a ilusão que construiu, tudo era estável, tinha para onde fugir mas sempre tinha para onde voltar. Amava a confusão, o barulho e as certezas de que tudo sempre ficaria bem, às vezes desejava silêncio, mas ainda assim, mesmo nesses momentos amava estar por ali, em meio a toda confusão que te tirava o ar e arrancava risos de desespero. Essa era sua vida, era uma boa vida. 

Você que sempre soube o que era amor, que sempre soube ser abrigo, agora não sabia como agir, era uma chuva torrencial que inundava seu peito com uma única certeza, nada iria restar e se sentir dessa forma era uma sensação desesperadora, de quem perdeu tudo e agora precisava de ajuda para recomeçar a catar seus pedaços pelo meio do caminho.

Depois de tantos risos ao pé do ouvido, depois das noites mal dormidas, e de todas as histórias construídas, tudo que vai restar é uma saudade vazia. Uma saudade que começou a ser construída antes do ponto final, uma saudade construída no meio de um parágrafo repleto de situações inusitadas. 

O silêncio que você tanto buscava, foi tudo que restou, mas ele não foi reconfortante, o silêncio era perverso, torturante e angustiante, ficar sozinho e imaginar os milhares de finais era desesperador. Pensar que aquele silêncio pode se tornar definitivo e aquela voz tão conhecida que te acompanhou por anos pode cansar, era inevitável, no início ela tentou se fazer presente, esconder o desespero de não conseguir saber o que falar, o que deixar, mas depois tudo deu lugar a um pranto contido que se tornou um desespero dolorido, que ansiava por um tempo que achava que não tinha. 

Não havia nada que pudesse fazer para sanar aquelas lágrimas ou para parar o tempo, não havia um ritmo a ser seguido, e todos os dias te lembravam de que não havia tempo a ser perdido, ele não parava e levava aos poucos um pedaço da sua história, não havia nada a ser desfeito e só restava esperar, esperar e desfazer seu pranto enquanto acalenta em seus braços os soluços sôfregos de quem já te deu tanto amor, sente a fragilidade daquele coração que tinha um ritmo tão peculiar de te encantar e mover seu mundo. 

Não há como nada ficar bem, não há… E constatar isso era a pior coisa a ser feita, não havia esperança, conforto ou afeto, havia apenas mágoa, dor e sofrimento. Era tudo tão latente e aumentava conforme o ponteiro do relógio findava, em um primeiro momento você achou que dava conta, abraçou o mundo como sempre fazia, se concentrou em não se concentrar na dor, ela existia, mas você não queria lembrar. Depois ficou impossível disfarçar e dar respostas prontas, a mente vagava e te roubava as palavras. 

As lembranças antes esquecidas invadiam seus dias, o cheiro do alvorecer e o medo do amanhã passaram a ter fazer companhia até mesmo nos momentos mais ínfimos, era uma lembrança constante de que tudo que restava era isso, um porta retrato sem cheiro, sem toque e quebrado. A saudade passou a ser uma amiga constante, não era confortável olhar para trás e observar todos os erros, acertos e afagos, na verdade era torturante, era desesperador sentir saudade do que ainda se tinha, mas sabia que iria perder.

Você se engasgava constantemente pensando em tudo que poderia ser feito e desfeito, se havia ou não tempo, tudo é tão subjetivo que te paralisa, não há como voltar no tempo, não há como parar o tempo, não há possibilidades, não há nada a não ser a estranha certeza de que qualquer coisa seria melhor do que o que estava acontecendo, você se culpava por isso, mas já carregava tanta culpa que essa era só mais uma …

Respirar é como se despedir segundo a segundo de quem nós somos, é como gritar em desespero em um navio que afunda. Eu sei, às vezes te falta ar, te falta ânimo para falar sem se engasgar com o ar que te sufoca, mas você continua porque sabe que se desistir vai ser pior, você sente medo do fim, mas sente mais medo do que vai acontecer depois do fim, depois que toda a tempestade passar, depois que a água que te sufoca baixar e você contabilizar o estrago…

Depois de tudo, tudo que vai restar é a estranha saudade, o constante desespero de não saber como continuar e a certeza de que você vai finalmente poder se consolar sem sentir culpa.

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Doação involuntária

No mês do orgulho, dedico esse texto para todos que se sentem presos de alguma forma.

Tem pessoas que doam dinheiro, outras doam amor, tempo, paciência e você doou tudo que podia para fazer parte de algo que não te cabia.

Você escutou durante tanto tempo que não cabia nos lugares e ainda assim queria continuar a tentar caber, seus sonhos não cabiam ali, e por isso você aos poucos foi se esquecendo deles, sorria quando riam dos seus sonhos, foi se desfazendo deles pouco a pouco até não restar mais nada. 

Eu não sei se é possível viver sem sonhos, mas para você bastava caber ali naquele espaço que tudo já era suficiente, esse era seu sonho, caber ali naquele lugar tão irregular e desproporcional, por isso tentou, por isso se despedaçou até caber naquela forma tão desconfortável. 

Quando sua forma de agir passou a também não caber, aos poucos foi se aprisionando, podando seus gestos, sua voz, sua forma de existir. Foi se moldando para ainda assim caber naquele lugar apertado, você era maior do que aquele espaço frio e repleto de solidão. 

Foi doando cada parte sua para caber em um espaço que só te fazia chorar, era como ser um passarinho dentro de uma gaiola, passou a ver o mundo pelas grades, passou a retrair suas asas e a falar só o que queriam ouvir, era domesticado e não se importava com isso, aos poucos foram arrancando suas penas, uma a uma elas iam embora enquanto suas lágrimas caiam e ninguém parecia ligar. 

Todos pareciam gostar do que estava se tornando, olhavam para dentro da gaiola e sorriam, você se sentia desnudo diante a tantos olhares, eles jogavam migalhas como recompensa, no começo achou ser suficiente, mas depois, depois elas foram se tornando tão escassas quanto a satisfação em as receber. Um enorme vazio tomava conta de você, a liberdade era convidativa, mas se aprisionou de tantas formas que o mundo do lado de fora da gaiola passou a também não te caber.

A sensação de que não cabia em nenhum lugar passou a fazer parte de quem havia se tornado, então ficava na gaiola, se sentia preso mesmo quando as portas estavam abertas, não importa o que fazia e nem por quem fazia, sempre queriam mais, queriam seus sorrisos, seu apoio, sua boa vontade em ser quem não era, não era desejado ali, mas ainda assim não iriam te expulsar porque no fundo eles precisam te usar, até não ter mais serventia, precisam te fazer útil mesmo te lembrando todos os dias da sua ineficiência em se adequar a aquele espaço.

Como todo passarinho você também sentia falta de um lugar quente, de alguém que entendesse o seu choro triste em meio às conversas, de voar para outros lugares, mas tinha medo e tudo que te restava era olhar para o chão e só ver sua finitude caindo, não tinha como esconder, todos percebiam e se você já não cabia lá antes, agora então é que tudo passou a ser um completo desencaixe. 

O choro latente que invade sua garganta fez com que te jogassem para longe daquele lugar, sua melancolia crescente era um convite a solidão, não tinha para onde ir, não tinha onde ficar, era uma peça quebrada em um brinquedo de encaixe, tentou lançar sorrisos falsos para se convencer de que tudo ficaria bem, mas nada ficaria, não se reconhecia havia se perdido de si mesmo a tanto tempo que não se entendia. 

Parecia que o choro latente que durante tanto tempo estava guardado resolvia sair em meio a tantas mágoas pelo recém abandono, a gaiola estava quebrada assim como suas asas, seu corpo doía por todas as penas arrancadas, sua voz não saia, e tudo que conseguia era desesperadamente tentar entender os motivos de terem o jogado para fora, você se esforçou tanto para caber, para se encaixar, deu tanto de si, amou mesmo os que te fizeram chorar, sorriu quando só queria se esconder, e ainda assim isso não bastou…

Depois disso, tudo que você queria era juntar seus pedaços e se recolher em um lugar onde ninguém te machucasse, foi se afastando de quem se aproximava, sua voz antes tão dócil se tornava áspera diante a qualquer ameaça de introdução no seu espaço, não queria se permitir machucar novamente, ainda doía e parecia que não iria passar tão cedo, andar por lugares desconhecidos ainda era como pisar em cacos de vidro, não sabia voar para os lugares que queria conhecer, parecia que ninguém era suficientemente treinado para te ouvir. 

Manter diálogos era torturante, não tinha ânimo para falar com pessoas que deduzia que iriam embora na primeira oportunidade, não importava se elas demonstram querer ajudar catando suas penas, era difícil acreditar, não queria ficar perto dessas pessoas, não queria acreditar que elas estavam ali por você quando nem mesmo você estava. 

Então você sentiu, sentiu um toque no canto dos seus olhos, tentou forçar sua visão para entender o que acontecia, você não conseguiu expulsar todos, um riso contido se fez presente, tentou entender o que acontecia e percebeu que o riso era seu, se sentiu culpado pela própria felicidade, mesmo que ela fosse irrisória diante a tanta dor. A culpa também passou a ser sua companheira constante, quanto mais perto as pessoas chegavam mais distante você queria ficar. 

Sentia culpa por não conseguir caber dentro daquele espaço, sentia culpa por não se reconhecer, sentia culpa por não ter um lugar para ir e nem para onde voltar, sua culpa é tão intensa que ela não te deixava sentir nada além da dor de não poder construir novas relações, se sentia tão incompleto, tão inacabado que tudo que sentia era culpa por não ser suficiente para permanecer ali com aquelas pessoas… 

Não importa o quão suficiente seja, você nunca vai caber em lugar algum, nunca vai ser o esperado ou o desejado, mas não é só você, ninguém vai ser. Se permita ter ajuda na hora de juntar seus pedaços e construir um novo espaço, onde caiba você por inteiro e não só aos pedaços, conte seus sonhos mesmo que eles pareçam bobos, ouça sua voz mesmo que digam que você fala desimportâncias. Escute o seu silêncio e cresça com ele, você não está sozinho, há sempre alguém que pode escutar seu piar de lamentação e que vai te fazer sentir em casa em meio a um abraço quente.

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Filme antigo.

Ainda é cedo amor

Mal começaste a conhecer a vida

Já anuncias a hora de partida

Sem saber mesmo o rumo que irás tomar

(Cartola)

Aos que se perdem no tempo e perdem tempo…

Algumas vezes seu relógio não marca as horas da forma correta, é como se o seu tempo não fosse cronológico, tem dias que seus minutos duram mais do que horas e outros tantos, suas horas passam mais rápido do que os segundos. É como olhar o mundo, seu mundo, sentado diretamente na cadeira de um cinema vazio, sem ninguém do seu lado, é como ser um espectador da própria vida. 

De repente não mais do que de repente, sua vida antes tingida de tantas cores parece ter virado um eterno filme em preto e branco, sem som, sem direção, a imprevisibilidade passou a fazer parte dos seus dias, você deseja que aquele longo e cansativo filme acabe mas ele não acaba ele se arrasta. Às vezes você assiste ao filme, outras tantas você se transforma em uma personagem coadjuvante que ninguém percebe por ali, uma personagem que arrasta uma longa corrente por todo o filme, é esse seu único enredo, ninguém repara nela, ninguém para, e todos os outros personagens evoluem, mas ela não.

Você percebe que parou e o mundo continuou a girar, todos a sua volta continuam da mesma forma seguindo com suas vidas, tropeçando em você e seguindo sem perguntar se estava tudo bem. As pessoas não param, não perguntam, apenas seguem, elas não querem perder tempo, elas não querem ter suas vidas estacionadas apenas por tropeçar em você. Quando você finalmente consegue se mexer, você percebe que o tempo passou, que ele correu e você nem percebeu. 

É uma batalha perdida, não tem como lutar contra o tempo, de alguma forma você não sabe como começou a se sentir assim, se foi algo de agora ou de muito antes de você se tornar adulto, mas aconteceu e agora tudo que você consegue fazer é assistir a esse filme que se repete dia após dia, você às vezes ri de forma involuntária, as piadas são sem graça mas você apenas faz, para não perder o costume, para que não percebam que as coisas mudaram. 

Algumas vezes é difícil manter o disfarce, e você desaba, e é como se aquele filme desastroso estivesse em um aparelho quebrado, ele é rebobinado várias e várias vezes para que você pudesse lembrar suas derrotas, seus medos e seus erros. Você desaba e se afoga naquele sentimento, não consegue escapar daquela correnteza, se sufoca, se esconde e se machuca. 

Seus suspiros são de desespero, afinal durante tantos anos o medo era tudo que você queria evitar e agora parece que de forma inevitável tudo que você tem pela frente é isso, o medo, o medo constante de se afogar e não ter ninguém ao seu lado, o medo de se tornar um eterno espectador da sua vida. O medo finalmente bateu à sua porta e se mostrou um hóspede bastante exigente, faz festas assustadoras que te tiram o sono, involuntariamente você tenta o expulsar, mas é como se aquela casa não fosse sua e você não tivesse direito a opiniões sobre quem vai ou quem fica. É um medo frio, vazio e silencioso, que te faz ficar doente. 

Viver se tornou sinônimo de esperar, você espera de forma impaciente para que aquela sensação vá embora e seus anseios que antes eram minimizados, se tornam cada vez mais presentes em sua vida. Você questiona o que faria se não tivesse tantos medos.

Dúvidas realmente pairam sobre a sua cabeça, será que as coisas mudaram e deixaram de ser tão prazerosas? Será que um dia elas foram realmente prazerosas? Constantemente sua cabeça roda e você se esquiva de dar respostas para perguntas que sabe que deveriam ser feitas. 

É complicado, seu tempo que antes era só seu, agora pertence a outras pessoas e você não sabe lidar bem com isso, sua cabeça entra em uma guerra constante para conseguir estabelecer objetivos. Tudo parece um eterno conta gotas de um remédio de gosto amargo, as gotas caem devagar e parece que nunca vai chegar a contagem final, você se angustia com aquela sensação de espera eterna. Você tenta ter paciência, tenta esperar, tenta desacelerar sua vida, mas se irrita fácil com o ritmo das gotas, elas caem devagar e parecem te machucar sempre. 

Não existe uma posologia para viver a vida, e por isso você se irrita constantemente pelo ritmo como as gotas caem, é vagaroso demais e você não se concentra naquilo, perde o foco, a contagem e não lida com o erro causado pelo seu cansaço de viver esse filme tão solitário. 

Constantemente você se força a dizer “tenho que continuar”, mas é um mantra falho, seu tempo que por vezes passa tão arrastado parece te impedir de continuar, parece te impedir de assistir esse filme solitário ao lado de outras pessoas, você anseia pelo final sem perspectiva de que ele se torne feliz, afinal você ultimamente dúvida do que é realmente felicidade. 

Por qual motivo você continua? Por qual motivo você não consegue ir por outro caminho, seguir por outra curva? Você se sente perseguido de forma constante pelo medo de errar… 

Sua mente tem muitos barulhos que não são seus, você diz sim quando sabe que deveria dizer não, utiliza vírgula onde deveria haver um ponto final, você escreve parágrafos novos para um assunto que já deveria ter terminado. 

Reinicia, olha para trás e respira, respira forte e tenta fazer o melhor que pode fazer, não o que você acha que as pessoas esperam que seja o melhor. A vida não vai parar, os minutos não vão voltar, mas você pode revisitar seus bons momentos, eles houveram, pode rir dos erros, comemorar as pequenas vitórias, mas não ultrapasse seus limites a vida é como um filme muito antigo, se você rebobinar ou avançar muito rápido, a fita agarra, o filme embola e tudo que vai restar é um drama mexicano como uma recordação que você não vai querer lembrar.

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Barulho de saudade

Em algumas línguas como o espanhol Saudade significa “Nostalgia de casa”, no nosso idioma, significa “um desejo melancólico e nostálgico por uma pessoa, lugar ou coisas, que estão longe, quer no espaço, quer no tempo”

Aos desconhecidos que sentem saudade, saudade de quem se ama e de quem um dia foi a sua casa…

De repente, não mais do que de repente, tudo fica silencioso e por mais barulhento que possa ser do lado de fora, aqui dentro, tudo parece que foi invadido por um turbilhão de emoções, consigo ouvir o ritmo frenético da batida do meu coração fora de ritmo, é algo que eu já deveria ter me acostumado, prendo a respiração de maneira não intencional, sinto meu olho inundar, a sede imediatamente me acomete, quero fugir, mas me sinto preso nessa imensidão que são meus sentimentos. 

É como se tudo voltasse, menos você. Não entendo o motivo, já se passou tanto tempo, não entendo os gatilhos, na verdade eu não entendo nada, e tudo parece me afogar. A cada instante é como se eu tivesse mergulhado em um mar revolto e não conseguisse voltar para a superfície, sinto algo me puxar para baixo, sinto a água me invadindo, sinto a dor em meu peito. 

Eu sou racional demais, mas ainda assim é dessa forma como me sinto, minhas mãos tremem, e eu me sinto desprotegido, não ouço ninguém porque parece que o silêncio se apoderou de mim, ninguém me ouve, ninguém me enxerga, me sinto ainda mais encolhido, eu não queria sentir, não eu não queria sentir…

Tudo que sinto nessa hora é saudade, saudade de te ouvir sussurrar que me amava, do seu abraço, de estar ao seu lado e de brincar de pique esconde até você me encontrar e me pôr em seus braços. Parece que eu sou uma criança esperando eternamente você me encontrar, esperando você chegar e me pedir desculpas por ter demorado demais…

Nesses dias eu sinto seu toque em meus ombros, como se você ainda estivesse aqui, aperto meus olhos, me encolho no primeiro apoio que encontro, me toco para te tocar, você não estava aqui, não tinha cheiro, não tinha abraço e tudo que restou foi um soluço abafado em meio a dor de não poder te ter novamente. 

Eu sinto raiva, sinto vontade de gritar, o desespero me consome e se mistura a minha saudade é algo angustiante demais para lidar sozinho, é algo que eu não sei controlar, mordo meus lábios, aperto meus braços, estrangulo meu coração, a dor não passa, o ruído em meu ouvido também não, ainda é como se eu ouvisse sua voz ninando minhas angústias e me dizendo que tudo ficaria bem. Mas nada ficaria bem, você não está aqui. 

Queria ter conversado mais, e não ter fugido dos seus abraços, queria ter atendido quando você me chamou, queria não sentir o que sinto, ter me despedido com calma e ter te agarrado para não ir, queria poder te ter todos os dias, principalmente nesses em que me sinto tão criança, quando preciso tanto do seu colo, quando tudo que quero é me esconder na sua cama.

Com você eu não tinha medo, eu não tinha saudade, não me faltava o ar para traduzir as palavras que tanto me prendem. A garganta sempre entalada pelo medo que me sufoca, a dor súbita me afoga, eu tento, você sabe que eu tento, mas às vezes eu não consigo. 

Chove lá fora, o vento frio toca minha pele, sinto seu cheiro e tenho certeza que não é a última vez, me afundo ainda mais naquela parede, o choro vem forte, o medo de não conseguir finalmente transborda para fora, eu não tenho para onde ir, nem onde me esconder, eu sinto que quero ser forte, eu sinto que poderia ser forte, mas me falta força. 

Se eu te pedir perdão será que você me escuta? Se eu te contar segredos, será que você me abraça? Eu quero te dizer como são os dias, como são os meus dias, nem todos são bons, mas eu faço o possível para conseguir levantar e me pôr de pé, mesmo sem você. Eu tento, você sabe que eu tento. 

Eu tento me lembrar do seu sorriso, do seu toque e do seu apego, eu quero não te esquecer, não esquecer do que você me ensinou e do que eu te ensinei. As lágrimas caem com um pouco menos de força enquanto me lembro de você, enquanto me lembro de como você me abraçava para que eu permanecesse aqui, para que eu continuasse, você acreditou em mim quando nem eu mesmo acreditei, então eu tenho que continuar…