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Rebelde: Lo que no fue no será

Logo da série da Netflix/2021

Eu não sou boa em escrever resenha, porém após assistir a primeira e a segunda temporada de Rebelde(2022/Netflix), isso me fez ficar um tanto quanto reflexiva sobre o que é considerado qualidade nos dias atuais, e sim eu gostei da construção da história, as atuações foram impecáveis (um salve para a talentosa Giovanna Grigio), a escalação de um elenco tão diversificado é um acerto essencial no século XXI, sem dúvida é uma série que cativa, apesar de pecar na superficialidade que trata suas tramas.

Eu sempre fui fascinada pelas artes cênicas, o poder de transmitir ao outro uma informação/sentimento apenas com o corpo sem dizer uma única palavra vivendo algo que não faz parte de você, criando sensações em desconhecidos que te assistem, é sim algo fascinante e ainda assim perturbador.

elenco principal da série

Pensando em metas e objetivos, quais são os dessa versão de Rebelde? Particularmente eu responderia que é apresentar alguns talentos que não eram tão conhecidos (não para um público Netflix) dentro de um ambiente nostálgico, afinal inegavelmente mesmo que a trama se torne atual ainda assim se mistura com as narrativas da versão Mexicana de 2004/2006

Adolescentes complicados, relações familiares complexas sempre deram um bom enredo e geraram uma certa identificação, mesmo que a maioria dos personagens venham de uma realidade social diferente da do público que está assistindo. Voltando a série, eu achei formidável a ideia de recriar o EWS, quase 17/18 anos depois, foi espetacular mostrar o que aconteceu com a instituição em consequência da ação da criação da banda Rebelde, a nova versão é mais sobre o EWS do que sobre Rebelde, o ambiente ganhou um programa de excelência musical considerado o melhor pelo público latino, mas não é só isso, ganhou também outros programas como o de administração e robótica, estudar lá ou em qualquer outra filial é se encontrar entre os melhores.

Primeiro dia de aula Emilia (Giovanna Grigio) apresentando o EWS

Se considerarmos então o foco da série como o EWS e o desenvolvimento dos personagens dentro dessa instituição podemos então considerar que ter apenas dez episódios por temporada, se torna algo impossível explorar todas as narrativas expostas ali, e limita os enredos a ficarem dentro do ambiente do EWS. Se têm personagens principais e uma penca de personagens secundários que possuem narrativas que mereciam ser trabalhadas com mais afinco, em uma novela com toda certeza seriam bem mais exploradas.

Pôster Rebelde 2004/2006 – México

A versão Mexicana (2004/2006) que a maioria de nós conhece possui 440 episódios e 3 temporadas, manter o sucesso e a qualidade durante tanto tempo e de forma tão linear fez com que a novela, mesmo sendo uma obra inspirada em uma versão argentina chamada de Rebelde Way (Cris Morena/2002-2003), se tornasse então a mais conhecida das versões. A versão Mexicana se tornou a fórmula do sucesso, as adaptações que vieram depois se baseiam no sucesso da versão Mexicana para assim tentar alcançar seu próprio sucesso, a versão atual de Rebelde (2021-2022/Netflix) deixa isso muito claro, ela traz elementos de nostalgia ao público a todo instante, os uniformes, a rivalidade entre as personagens principais, Colucci, Celina, Pilar e as histórias dos seis membros da Rebelde que rondam a trama como um fantasma

Pilar e Celina

Esse revival mantém viva a história de 2004 como se nada tivesse terminado, mantendo acesa a chama de todo fã do RBD que sonha com a volta do grupo e novas turnês, foi uma jogada muito inteligente, mesmo que os membros do grupo sejam apenas mencionados, ainda assim eles se encontram presentes nas narrativas, mas isso é suficiente?

Mesmo com episódios relativamente longos é muito fácil em um fim de semana de folga maratonar as duas temporada, se é fácil maratonar, significa que tem potencial para ser um viral. É uma história com enredo próprio, que mistura os problemas atuais com narrativas já conhecidas, e para mim o problema é exatamente esse, são tantas histórias para cada personagem que dez episódios se torna muito pouco tempo para as explorar, as histórias não tem continuidade, tudo é tão rápido, que até as músicas ganham uma interpretação rápida, e é por isso que para mim o personagem principal é o EWS, todas as narrativas morrem fora da instituição. 

Vou dar um exemplo da minha interpretação favorita, Franco Masini para mim ganhou o personagem com mais potencial para ter uma trama explorada, entretanto não foi o que aconteceu. São tantas ramificações para serem exploradas que ao longo da primeira temporada eu fiquei esperando esse desenvolvimento que não aconteceu de forma tão profunda assim, afinal são dezenas de histórias, dez episódios e entorno de 35 minutos em cada episódio, particularmente eu esperava mais conflitos entre Luka Colucci e Marcelo (o pai), por exemplo o mecanismo de defesa de Luka, é ter um comportamento vilanesco com o resto do mundo, tá sempre atacando para não ser atacado, se alia a seita, e essa aliança com um grupo suspeito só porque ele quer vencer e se mostrar o melhor, não faz sentido, ele tinha uma banda que estava vencendo e por mais que ele não gostasse da Jana, ainda assim eles eram um grupo com muito potencial, no primeiro episódio Luka tem uma das interpretações mais tocantes do episódio, a cena em que ele canta “Lo que no fue no será” para o pai, é algo tão carregado de emoção que merecia um desenvolvimento tão maior do que teve…

Franco Masini como Luka (Rebelde/2021-2022)

Mas por qual motivo Luka se torna o meu personagem preferido? Simples, Franco interpreta Luka com tamanha perfeição que até mesmo os olhos falam por ele, isso compensa a falta de desenvolvimento do enredo, se houvesse um pouco mais de tempo de tela para esse desenvolvimento poderíamos ver um pouco do emocional de um adolescente que quer o amor e aceitação do pai, que não consegue estabelecer vínculos de amizade, que teve sua sexualidade exposta contra a sua vontade, que demonstra uma afeição com o álcool para fugir dos problemas e que se apega a qualquer possibilidade de mostrar o seu valor e realizar suas ambições, mesmo que isso o machuque ou machuque outros e se somar tudo isso ao fato de que ele traiu os amigos e depois os ajudou e ainda ganhou um irmão bastardo que é filho da sua ex professora de piano, o personagem seria uma grande bomba relógio, no mínimo ele deveria ter tido uma crise de ansiedade, mas não é o que acontece, o rapaz é inabalável, cabendo a Franco Masini interpretar Luka até com o último fio de cabelo do corpo, diminuindo o tom de voz, brincando com o olhar, ora reprimido, curioso e revelador.

Se levarmos em conta que toda história é como uma grande árvore, Rebelde é uma árvore com um tronco gigante e muitos galhos e ramificações, se tivessem podado alguns galhos do enredo, aprofundado a emoção e as relações dos personagens nos galhos que sobraram, mostrando a consequência de cada reação a história se tornaria ainda melhor e até mesmo um pouco mais contínua. 

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Conjugar…

Escreva os sentimentos que não são seus…♥

Silêncio!?

Vazio, dor, angustia, medo!

Barulho…, com todas as vozes e meus medos!

O silêncio esconde tudo que eu queria viver.

O silêncio me machuca pois é vazio e o vazio é assustador.

O silêncio me lembra constantemente daquilo que tento esquecer: Meus desejos.

Desejo?

Tenho medo do que desejo.

Desejo aquilo que por vezes não posso ter.

Desejo coisas que me preencham e que ninguém entende,

Desejo saudades de amores inventados,

Desejo pedaços das brigas que não tive por frases que não falei.

Desejo as brigas que não briguei, por coisas que acredito.

Desejo aquilo que já tenho, mas que não sei como sentir.

Desejo sentir de forma diferente aquilo que existe em mim.

Sinto?

Não sinto nada além do que não queria sentir.

Sinto que não tenho espaço no mundo, e que o mundo é pequeno para mim.

Sinto o vazio por existir.

Sinto o desejo de querer estourar a bolha que me impede de voar.

Sinto aquilo que me falam.

As vezes dói na hora, as vezes depois, mas sempre dói.

Sinto o medo por tudo que sinto em mim e eu só quero que tudo pare, que tudo passe.

Querer?

Já não sei o que quero, o que sinto, o que desejo.

Quero uma pausa no tempo,

Quero me lembrar novamente do meu amor,

Quero entender onde foi que deixei de sentir e me perdi no meio de tudo em mim.

Eu quero entender o que é existir.

Amor, Ansiedade, Capitalismo, cartas, Crônica, depressão, Minhas Crônicas, Opinião, Padrão, Poesia, Sem categoria, silêncio

Armário bagunçado

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Para uma outra criança que encontrei por aí… talvez ela seja tão bruxa quanto eu.

Tudo era uma confusão.

Não sabia o que sentia, não entendia nada que acontecia, as vezes tudo que sabia era que a incerteza eram sua única certeza;

Não contava mais quantas vezes seu riso escapou ou quantas vezes suas lágrimas surgiam sem motivo aparente.

Não entendia como respirar podia ajudar, sentir a vida se esvaindo entre sua corrente respiratória nunca ajudou.

Era pesado sentir tudo aquilo entrando e saindo de dentro de si…

Contou todas as vezes que deixou cair algo importante enquanto respirava:

Deixou cair seu coração…

Deixou cair seu equilíbrio…

Deixou cair o que acreditava ser certo.

Tudo escapou naquele espaço tão pequeno que existia entre os sentimentos e o vazio.

Sentir…

Era bom sentir, sabia que vivia assim dessa forma: sentindo.

Era ruim sentir, era devastador não poder controlar o que sentia.

Tentou guardar tudo no armário, mas era muita coisa e quase nada cabia naquele espaço tão pequeno, as portas logo cederam e tudo desmoronou em cima de si.

O ar fugiu, e tudo ficou mais turvo do que costuma ser.

Se deparou com coisas que nem ousava pensar ter guardado, havia guardado realmente muita coisa.

Encontrou seus gritos escondidos no fundo do armário.

Encontrou as palavras carregadas de sentimentos que guardou por baixo de todas as tralhas desimportantes.

Encontrou as vozes, aquelas que queria esquecer, mas que não podia negar a existência, elas se multiplicavam.

Se culpou, afinal não soube guardas as coisas dentro do armário.

Se culpou porque quando olhavam para si viam aquela bagunça toda que escapava daquele espaço tão pequeno.

Se culpou porque supostamente sua bagunça havia respingado em outras pessoas.

Era estranho, complicado e inteiramente desconfortante.

Tudo que sentia era rápido e não podia controlar, não entendia muito bem como as outras pessoas escondiam tão bem tudo dentro de seus armários.

Não entendeu quando quis se enfiar por inteiro dentro daquele espaço tão pequeno e quebrado.

Respirar doía e ninguém deveria sentir dor enquanto respirava, mas nem sempre era assim.

As vezes respirar era bom, sentir todo aquele ar correndo dentro de si era confortante, era sinal de liberdade, de vida, de história.

Queria ser como o vento, livre, entrar e sair sem pedir licença.

Queria sair sem que perguntassem o motivo, queria sentir que era vida, que era a vida que existia nos outros e em si.

Queria sentir e saber o que sentir.

Preferia pontos finais á vírgulas, não gostava de criar continuação para nada, até gostava, mas se preocupada demais com tudo, pontos finais eram rápidos emergências e não precisavam de explicação.

Era difícil entender que tudo que sentia era seu, eram suas angustias, seus medos, suas alegrias e amores, tudo era seu e de mais ninguém.

Ninguém poderia engavetar o que sentia, ou guardar nos cantos do armário aquilo que não agradava por muito tempo.

Era difícil, era dolorido, era confuso, mas também era bom, afinal as vezes é bom no meio de toda aquela bagunça que desaba sobre nós descobrirmos que lá dentro também está guardado o que somos.

É bom nos reencontrarmos, redescobrirmos o que sentimos e entender ou desentender o que nos faz chorar e sorrir.

 

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Humanas:Exatas

O blog da garota de Exatas que também é de Humanas…
Serei grata se puderem me visitar lá também…

Ela é de Exatas

Quando você faz uma faculdade ligada a licenciatura é complicado você se tornar aluna em uma outra graduação de características técnicas. Ser pedagoga dentro de uma faculdade de tecnologia é minha identidade secreta. Eu até acho que falta didática em alguns dos meus professores, mas isso não é o que me incomoda, o que eles têm em sala de aula algumas vezes não é o que tenho de formada, quem sou eu para julgar alguém?

A realidade é que cursar uma graduação de Tecnologia talvez tenha me feito evoluir mais como pessoa e educadora do que eu jamais pensei evoluir. É verdade que o mundo de exatas é muito mais capitalista e individualista do que eu estava habitualmente acostumada. Isso foi sim um problema, não vou mentir. Mas não posso negar que no meio de todo aquele caos de onde eu quero fugir a todo instante, eu consegui…

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Ansiedade, cartas, Crônica, Minhas Crônicas, Sem categoria, silêncio

Respirar

Tente passar pelo que estou passando
Tente apagar este teu novo engano
Tente me amar pois estou te amando

-Pérola Negra

Composição: Luiz Carlos Dos Santos

Certo dia senti vontade de voltar a escrever e senti preguiça, o texto morreu antes mesmo de nascer. Mas hoje em meio a meditação ao som de Caetano e os livros de engenharia de requisito que eu deveria ler, resolvi me arriscar a escrever sobre o que mais amo amar, pessoas.

Ao irmão extraterreno.

Era confuso, muito confuso.

Ninguém entendia, nem quem estava perto e muito menos quem estava longe. Nem ele se entendia.

A respiração pesava, e parecia acumular um bolo no meio do peito, era pesado, estava cansado, a dor não era explicável e nem tinha remédio, era angustiante e tudo que queria era se encostar em algum lugar, onde a dor tão inexplicável pudesse ser sentida.

Respirar, respirar era tudo que queria. Fechar os olhos e ouvir o som das ondas batendo nas pedras, como ninguém jamais o ouviu.

Não gostava de responder perguntas, porque geralmente não tinha respostas. Não gostava de não ter explicações para as lágrimas ou para o acumulo no peito que o impedia de encontrar palavras e tentar se explicar.

Ele nem sabia os motivos de tentar se explicar, mas era como se a todo instante lhe cobrassem isso. Era dolorido, denso e perverso, não tinha explicação.

Respirar, tudo que restava era respirar e sentir todo aquele ar invadindo seu corpo. Respirar era se sentir pesado pelo que não conseguia colocar para fora.

Era estranho como todos achavam que o conheciam, e que tinham a solução para o que estava sentindo. No meio de todo aquele caos que eram seus sentimentos, tudo que conseguiam era que ele achasse que seus sentimentos eram o problema.

Ele respirava forte e engolia o que queria sair, respirar as vezes era se sentir fora do próprio corpo. Respirar era dolorido, machucava e rasgava. O que não podia sair transbordava e inundava quando menos esperava.

Respirar, respirar e fechar os olhos, tudo escuro, tudo que se ouve são gotas caindo no nada, vazio sufocante. Respirar era viver em um silêncio barulhento.

Era difícil se ouvir em meio a todo aquele barulho que vivia sua mente, não eram frases fáceis de serem compreendidas, era tanto barulho que lhe dava vertigem e facilmente ele se perdia principalmente pelos caminhos fáceis.

Era mais fácil aceitar que seus passos jamais seriam retos.

Respirar, respirar as vezes era pesado, mas também era leve. Respirar era ter calma, para não se engasgar com si mesmo.

As vezes ele conseguia se entender, não era tão fácil, mas se contentava em chegar mesmo que por caminhos tortos nos lugares que deveria.

Respirar enquanto caía e se machucava era uma especialidade, o ato de respirar era longo, denso e solitário a espera que no final alguém o enxergasse e o ajudasse a levantar, alguém que o ajudasse a respirar.

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Mentiras sobre “nós”

173/366 - Abseits / Offside
Disponível em pxhere

 

Atenção: esse texto contém menção a depressão, abuso e suicídio. Se achar que isso pode ser um gatilho, por favor não continue essa leitura.

Nó: Enlaçamento de fios, de linhas, de cordas, de cordões, fazendo com que suas extremidades passem uma pela outra, amarrando-as. [Figurado] Vínculo; ligação estreita entre pessoas por afeição ou parentesco. [plural] nós.

Nós:Pessoa que fala e mais uma ou várias;

Dicionário: dicio

Quando a criança falou, eles não ouviram;

Quando tropeçou enquanto tentava fugir, ninguém estava na sua frente para frear seus passos;

Quando disse “não”, ninguém desconfiou que era medo.

Quando disse “sim”, ninguém percebeu que ele gritava por dentro dizendo não.

Fugiu, ninguém percebeu;

Gritou, falaram que era birra, “coisa de criança”;

Seu corpo não parava quieto, mas “era o efeito da hiperatividade”;

Roeu as unhas, puxou os cabelos, mordeu os lábios, “era de ansiedade”;

Cresceu, e quanto mais crescia mais remédios de nomes complicados conhecia;

Não gostava de chorar, de falar, de respirar, “o nomearam como depressivo”;

Não queria engolir a comida, já engolia muitas palavras enquanto diziam ser só mais “alguns de seus delírios”.

Se retraía, tentou se esconder, encolheu seu corpo e tremeu, “não suportou tudo que teve que segurar”. Não estava frio, mas tremeu.

Chorou como chorava quando era criança, não adiantou, ninguém veio em seu socorro, tudo continuava no mesmo lugar, a cama, o chão, as paredes, e os gritos que com o tempo aprendeu a conter.

No fim de tudo, nada restou, as lágrimas caiam, e a dor que o dilacerava era mais cortante que o objeto que ele usou para dar fim a tudo.

Não se despediu, não disse “eu te amo”, não mandou sinais de aviso. Ele apenas foi, foi ser livre enquanto deixava suas verdades finalmente saírem e como se não se importasse se iriam ou não acreditar nelas depois de tanto tempo. Ele apenas foi, sem se importar com tudo que podiam dizer.

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Diáspora

Diáspora.png

Diáspora : dispersão de um povo em consequência de preconceito ou perseguição política, religiosa ou étnica.

Se perderam…

Não era silencioso, havia correria, era turbulento…,

se perderam mesmo de mãos dadas.

Eram rostos tão diferentes, vozes diferentes, ninguém se entendia, ninguém se conhecia e os que se conheciam se perdiam, ou haviam perdido.

perdido, perdido tudo, desde abraços, afagos até lembranças.

Não existiam mais as paredes que guardavam segredos, ou a escadas responsável por tantos tombos, não tinham como voltar para os braços que recebiam sempre abertos.

Tudo se perdeu não só para si como para todos.

Eram desconhecidos que reconheciam suas dores, as mãos que consolavam eram igualmente consoladas.

O peito subia, o peito descia, as pernas tremiam, a voz falhava, não se reconhecia, procurava por quem lhe pertencia.

Seu pedaço da história havia se perdido de si, o vento era quente e sufocante, lhe roubava todo o ar, era como se sua cabeça não conseguisse se concentrar, pesava.

Tudo pesava, pesava mais do que quando o carregou no ventre, pesava mais do que quando o carregou pela primeira vez nos braços.

Não entendia o que acontecia, uma hora o tinha tão perto de seus braços e no outro o perdia.

Não havia vento, e ainda assim sentia como se seus passos fossem a cada instante apagados.

Não havia como olhar para trás, não tinha como voltar.

Nada mais existia, nada além do desespero de não se ter para onde ir e pra quem voltar.

Transforam as lembranças em poeira, tiraram seu futuro das suas mãos.

Sentiu a dor dos que perderam seus amores, sentiu sua própria dor enquanto gritava em desespero.

Doeu, se dilacerou por dentro.

Fechou os olhos e viu a massa cinzenta, o fogo, e o vermelho carmim que manchava tudo inclusive sua roupa.

Se perdeu,

aos poucos se perdeu dentro de si.

A escuridão foi aos poucos enevoando tudo…

Quando mais se apertavam para caber naquele espaço tão pequeno, mais sua cabeça recordava os gritos.

A dor aumentou, não existia luz.

A angustia entalou na garganta, não tinha o que mais por pra fora além de seus gritos.

Atravessamos o mar Egeu
O barco cheio de fariseus
Como os cubanos, sírios, ciganos
Como romanos sem Coliseu
Atravessamos pro outro lado
No Rio Vermelho do mar sagrado
Os Center shoppings superlotados
De retirantes refugiados

(Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Marisa Monte)

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Carolina Maria de Jesus – Diário de uma Favelada

200px-Carolina_Maria_de_Jesus_assinando_seu_livro_Quarto_de_Despejo_em_1960

Carolina Maria de Jesus (1914 – 1977), foi mais uma das escritoras que conheci durante minha graduação, especificamente durante uma disciplina que estudava a relação de identidade e diários. É estranho tentar entender como uma das escritoras mais importantes de nossa história, reconhecida mundialmente, só me foi apresentada na graduação, no auge dos meus vinte e poucos anos.

Quarto de despejo se tornou o livro que a fez ser conhecida, as palavras que juntas compõe esse livro, se tornam importantes para podermos entender a sociedade da década de 50, pela perspectiva de Carolina, uma catadora de lixo, mulher negra, periférica e mãe solteira, que dia a dia matava seus leões dentro e fora das vielas paulistana.

Sofreu violência de gênero, social e racial, suas linhas não nos fazem sorrir, não nos iludem, são duras, é a realidade e não a fantasia, não teve bolo de aniversário na festa de sua filha, porque não se tinha dinheiro nem para o pão.

Carolina retratou em seu diário muito mais do que ela imaginou, escreveu como quem conta um segredo a um amigo, confessou suas angustias diante a fome de seus filhos e os julgamentos de seus vizinhos, ela questionou, não se calou e gritou para que a ouvissem.

Não queria se submeter a homem algum, era mãe solteira, foi mãe de filhos que nem eram seus para os proteger dos julgamentos que ela tão bem conhecia, se preocupou quando eles demoravam a voltar, abraçou apertado, tão apertado que quase se tornou possível deslumbrar do momento enquanto se lia.

Quarto de despejo foge dos padrões da nossa literatura, ou melhor foge dos padrões da nossa norma culta da linguagem, sua protagonista é negra, pobre e desbocada, trabalhava de sol a sol e lutava para que sua vida não se resumisse a sua casa de madeira, Carolina não era só escritora também era uma leitora que também lia o mundo.

Literatura Marginal, é assim que se chama essa escrita, livre das tradicionais amarras que costumamos ser apresentados na escola, a forma como falamos e escrevemos também é motivo de exclusão, a normatização da linguagem é um instrumento de dominação, onde só se valida o que uma pessoa fala se “sua fala” condizer com as regras de linguagem. Normatizar a linguagem, é excluir outras formas de expressão, outras culturas.

Estudei em escola pública durante minha vida inteira, salvo na educação infantil, eu sei a importância que a literatura de Carolina tem para alunos periféricos assim como tem para mim. Carolina escrevia sobre a sua vida, seus dilemas, sobre mais de cinquenta décadas atrás, quando o Brasil começa a se desenvolver economicamente, e ainda assim nós encontramos tantas semelhanças.

Carolina não se resumiu a quarto de despejo, que era bem mais do que sua casa de madeira, quarto de despejo era a cidade de São Paulo, a sociedade que a excluía de todas as formas possíveis, como se gritasse a todo instante que o lugar dela e de seus filhos não fosse no asfalto.

Quarto de despejo não foi seu único livro, na verdade foi seu diário, antes dele ela havia tentado publicar crônicas e poemas, mas só com seu diário, que ela passou a ser notada e justamente pelo motivo que era excluída. Apesar do livro de rendido bem, Carolina viu pouco desse dinheiro, na verdade ela viu o suficiente para que saísse da favela e fosse morar em um pequeno sítio na periferia de São Paulo.

Outros Livros:

Casa de Alvenaria (1961), Pedaços de Fome (1963), Provérbios (1963). O volume Diário de Bitita (1982) (Publicação Póstuma).

Links Literalmente Legais (L³):

Documentário

Conversa com Bial

Literafro

QUARTO DE DESPEJO – MANIFESTAÇÃO DO DISCURSO FEMININO NA
LITERATURA BRASILEIRA

Recomendação de Leitura: Preconceito Linguístico de Marcos Bagno

 

Crônica, Feminismo, Minhas Crônicas, Opinião, Sem categoria, silêncio, Violência

Procursu

fuga

Correu,

Caiu,

Desesperou-se,

Não olhou para trás enquanto fugia,

Correu mais um pouco, não se importou se o joelho estava ralado, se estava descalça, se tudo em si doía.

Atravessou a cidade aos gritos e mesmo assim ninguém a ouvia.

Seus gritos se tornaram silenciosos, suas dores passaram a não importar, era mais uma entre tantas e tantas na rua.

Correu, quando sentia que não valia mais apena correr,

Caiu e mesmo sem ter a onde se apoiar, insistiu em levantar.

Desesperou-se porque se viu sozinha no meio de uma rua desconhecida.

Esbarrou, empurrou, ninguém se importou,

Não houveram perguntas quanto ao seu desespero,

Não houveram respostas aos seus suplícios,

Não,

Não,

Não, era uma sequencias de negações que começavam nela e terminavam do outro lado de todas as ruas pelas quais passou.

Sorriu,

Sorriu entre as lágrimas que insistiam em cair,

Riu de si mesma por ter acreditado,

Se achou culpada por tudo que aconteceu,

Mentiu, mentiu para si mesma dizendo q estava tudo bem, “não estava”.

 

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Cora Coralina – Aninha e suas pedras

coracoralina

Não sei…

se a vida é curta

ou longa demais para nós.

Mas sei que nada do que vivemos tem sentido,

se não tocarmos o coração das pessoas.

(Não sei)

Cora Coralina (1889-1985),  morreu quando eu ainda nem era nascida, em 1985 meus pais nem sonhavam em se conhecer. Quando conheci seus versos, eu já havia me tornado adulta, quase tão adulta quanto Aninha em algumas daquelas linhas.

Não te deixes destruir…

Ajuntando novas pedras e construindo novos poemas.

Recria tua vida, sempre, sempre. Remove pedras e planta roseiras e faz doces.

Recomeça.

Faz de tua vida mesquinha um poema

(Aninha e suas Pedras)

Me encantei por Cora entre os corredores frios e cinzas da UERJ, os versos pareciam ecoar por cada canto daquele lugar. Suas confissões de menina, faziam eco ao meu coração, suas linhas não eram nem versos e nem poesia, “era um jeito diferente de contar história”. Por mais que ela falasse dela, e eu soubesse disso, parecia que falava de mim, ao mesmo tempo que parecia falar de outras, sua voz não era singular, era plural. Era a voz de quem havia se deparado com muitas pedras e as transformado em poesia.

“Entre pedras

cresceu a minha poesia

Minha vida…

Quebrando pedras

e plantando flores”

(Das Pedras)

Ana Lins dos Guimarães Peixoto, era Cora e Cora era Ana, Aninha, a terceira das quatro filhas, orfã de pai praticamente ao nascer, estudou até a terceira série, teceu ainda na infância seus primeiros versos sem vírgulas, palavras ou linhas, mas que tinham cheiro de mato, de terra molhada, de bolo recém assado pelo vó.

“Era só olhos e boca e desejo

daquele bolo inteiro”

(Antiguidades)

Escreveu suas linhas para fugir de tudo que a machucava, eram sobre o que sentia, sobre o que viveu, e sobre o que ainda queria viver, eram lembranças de uma menina, contadas por uma senhora que continuava a devorar o mundo e a mostrar a ele todas as suas pedras, todas as suas lutas.

Aos 70 anos aprendeu datilografia para que suas poesias pudessem ser enviadas aos editores, aos 75 anos publicou seu primeiro livro, morreu aos 95 anos… Drummond dizia que ela era: “uma velhinha sem posses, rica apenas de sua poesia, de sua invenção, e identificada com a vida como é”.

“Sendo eu mais doméstica do
Que intelectual,
não escrevo jamais de forma
consciente e racionalizada, e sim
impelida por um impulso incontrolável.
Sendo assim, tenho a consciência
de ser autêntica.
Nasci para escrever, mas o meio,
o tempo,as criaturas e fatores
outros contramarcaram minha vida.
Sou mais doceira e cozinheira
do que escritora, sendo a culinária
a mais nobre de todas as Artes………
Nunca recebi estímulos familiares para ser literata
Sempre houve na família, senão uma
hostilidade, pelo menos uma reserva determinada
a essa minha tendência inata.”

(Cora Coralina, quem é Você?)

Cora assinava aquilo que Aninha vivia, se tornou poesia em meio a resistência, era tão única quanto o nome inventado, fugiu, amou, vendeu livros, lavou roupa, sofreu a dor da perda, mais de uma vez, se fez doceira que conservava histórias, foi mulher rendeira que teceu seu próprio destino. Dentro de si, existiam tantas e tantas vozes, que ler suas linhas é como caminhar na corda que tece a vida, não só a de Aninha, mas a de Cora e também a minha.

Todas as Vidas

Vive dentro de mim
uma cabocla velha
de mau-olhado,
acocorada ao pé
do borralho,
olhando para o fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço…
Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro.
Ogã, pai-de-santo…
Vive dentro de mim
a lavadeira
do Rio Vermelho.
Seu cheiro gostoso
d’água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa,
pedra de anil.
Sua coroa verde
de São-caetano.
Vive dentro de mim
a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga
toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.
Vive dentro de mim
a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda,
desabusada,

sem preconceitos,

de casca-grossa,
de chinelinha,
e filharada.
Vive dentro de mim
a mulher roceira.
-Enxerto de terra,
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos,
Seus vinte netos.
Vive dentro de mim
a mulher da vida.
Minha irmãzinha…
tão desprezada,
tão murmurada…
Fingindo ser alegre
seu triste fado.
Todas as vidas
dentro de mim:
Na minha vida –
a vida mera
das obscuras!

Links Literalmente Legais (L³):

Documentário Cora Coralina – todas as vidas

4 poemas de Cora Coralina 

A sabedoria de Cora Carolina em 4 poemas

Enciclopédia Itaú Cultural 

Cora Coralina – por Elder Rocha Lima

15 Poemas de Cora Coralina