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Muito pouco, (IN)sanidade.

loucuraa

Pronto

Agora que voltou tudo ao normal

Talvez você consiga ser menos rei

E um pouco mais real

 (Muito pouco, Moska)

Olhou…, não reconheceu aquele espaço, era tudo tão igual a antes, mas ainda assim tão diferente, como não percebeu que tudo mudou?

Seus sonhos não estavam no lugar certo, estavam todos encaixotados, empoleirados, deixados de lado no canto de um quarto empoeirado.

Andou por todos os cantos, mas nenhum canto era o seu. Olhou-se no espelho e não se reconheceu, as roupas, o cabelo, o tênis, era o seu corpo, mas não era ele. Escorregou os dedos no espelho e sentiu o toque gelado, não havia diferença no reflexo e em si. Quando ficou assim?

Afastou a mão e levou ao rosto, não sentiu o habitual sorriso, nem se lembrava quando aquele canto dos lábios deixou de abrigar sua alegria.

Viver tá me deixando louco

Não sei mais do que sou capaz

Gritando pra não ficar rouco

Em guerra lutando por paz

Seus pés não estavam descalços mais ainda assim doíam como se estivesse andando a horas em círculos, era tudo sempre igual, deslizou-se por qualquer parede, respirou fundo e se sufocou com as lembranças.

A música que tocava era a mesma de ontem, e de todos os dias anteriores, era um disco repetido que o lembrava que o condenaram por não seguir a um mesmo ritmo, por não andar na linha, por não seguir à realidade dos fatos.

Era tudo tão chato, era sempre mais do mesmo. Era insuportável ver a mesma paisagem da janela, ter seus passos milimetricamente controlados, se sufocar dentro da roupa e de si mesmo. O suspiro sobrepôs à música, foi alto e desesperador, era um grito sem palavras que ecoou por todos os cantos.

Fechar os olhos não adiantava, ele não esqueceria, mas não reconhecia aquela certeza que tantos tinham como absoluta.

Pesos e medidas não servem

Pra ninguém poder nos comparar

Porque

Eu não pertenço ao mesmo lugar

Viver…, quando viver passou a ser sinônimo de “não viver”? Seus dias eram eternas tempestades, tropeçava nos próprios pés, eram os mesmos gostos, os mesmos caminhos, e aquilo, aquilo não bastava.

Era tudo tão cinza, uma eterna neblina que escondia tudo inclusive a si.

Sentiu saudades dos seus sonhos e abriu uma das caixas, eram tantos, lembrava-se de quando eles transbordavam de dentro de si e inundavam o mundo. Respirou fundo, sentiu todo aquele aroma de liberdade, quando havia se contentado em aprisionar seus sonhos?

Mal percebeu quando suas mãos rasgaram cada uma das caixas, o perfume da liberdade inundava a casa, as roupas estavam o sufocando, ele não era o mesmo, preferia transbordar a se conter.

Deixou-se transbordar enquanto respirava cada sonho, cada lembrança, cada parte daquela realidade particular, que criou para sobreviver dentro da “verdadeira” realidade tão insana.

E muito pra mim é tão pouco

E pouco é um pouco demais

Viver tá me deixando louco

Não sei mais do que sou capaz

  • Música utilizada
  • Muito Pouco – Paulinho Moska
Cozinha, Entrevistas, escolhas, Feminismo, Sem categoria

Entrevistando Elas I… O fantástico mundo das panelas de Andrenize.

Dias desses me questionei se eu realizei alguns dos projetos de 2017, entrevistar mulheres desconhecidas era uma desses projetos, no fim, esse foi um dos projetos que não vingaram por conta de uma preguiça inegável. Que 2018 se torne o ano das realizações e para dar início a essas realizações, vamos começar com uma entrevista realizada em agosto.

Conheço Andrenize, a entrevistada, a mais ou menos quinze anos, cursamos a segunda parte do fundamental juntas, e eu nunca a imaginei cursando gastronomia, a imaginava como advogada (altas tretas com resoluções nada suaves). Eu também não me imaginava cursando uma segunda faculdade, ainda mais uma de T.I. Quem somos e quem imaginamos ser na adolescência são duas coisas distintas.

Ela entregou seu projeto final em dezembro de 2017 e eu achava que devia no mínimo a publicação dessa entrevista para a homenagear.

Quando eu pensei nessa série de entrevistas, pensei em entrevistar mulheres desconhecidas, que eram estudantes ou haviam deixado de ser a pouco tempo, com o objetivo de mostrar esses variados ambientes de trabalho, suas visões de mundo, suas perspectivas tanto como estudantes tanto como parte do mercado de trabalho.

Andrenize que na época cursava gastronomia nos trás aquele meio termo entre o sonho e a realidade. Ela é competente, trabalha desde cedo, se encantou pela cozinha e por lá ficou (mas ela, ela não é só isso). Em meio a uma conversa nada convencional no aplicativo de mensagens, ela respondeu minhas perguntas, revelando parte do seu cotidiano como cozinheira e parte dos seus sonhos como ainda estudante.

Se deliciem com essa entrevista que deixa evidente os sonhos de todo e qualquer estudante e a realidade fática dos primeiros empregos antes do sucesso esperado. Onde se descobre que além do amor, da competência e do esforço dentro da cozinha é necessário conviver com aqueles pequenos incômodos como o machismo, a hierarquia e o jogo de poder… Cozinhar é complexo jovens, trabalhar na cozinha é ainda mais…

Nize
Acervo pessoal de Andrenize
  1. Fazer gastronomia foi uma escolha difícil? Quando você fala o que faz, a reação das pessoas é diferente do que imaginava?

sim. Pois eu imaginava ser outra pessoa, e ter outra profissão. Sonhei na adolescência ser contadora. Sim, as pessoas “julgam ” pela aparência talvez, e sim me dão outra profissão e não a minha de fato, cozinheira.  Acredito que a imagem de cozinheiro, seja uma vozinha gorducha, fofa, que cozinha muito para sua família, ou “uma mulher relaxada ” sem vaidades. E por isso talvez surpreenda as pessoas quando digo ser cozinheira rs…

  1. Você já trabalhou em alguns lugares, você acha que existe muita diferença entre o que você aprende nas aulas e a realidade de uma cozinha profissional?

Completamente diferente. Na faculdade aprendemos as técnicas, estudamos na teoria tudo típico de tal país (lugar) para conhecer profundamente aquela cultura e/ou história, para que possamos entender o prato quando for feito. Na prática (em sala de aula), fazemos tudo em pequenas quantidades para somente aprender as técnicas e como deve ser feito, seguindo as fichas técnicas e as ordens do professor. Sempre com muitos detalhes para ser perfeitos tanto cortes quanto sabor, com ingredientes originais para poder assim conhecer e levar no decorrer de sua carreira.

No mercado de trabalho, é correria, é grande quantidade, os alimentos feitos no seu preparo *mise en place . Tudo tem tempo de corte, é preciso agilidade, pensamentos rápidos, ter foco, ser objetivo se algo por um acaso der errado tem que existir um plano B de imediato.

  1. Um chef no qual você se espelha? Qual o motivo?

Não sigo, nem quero ser igual a nenhum chef. Na verdade, procuro disputar para ser a melhor. Não busco e nem tenho nenhum como exemplo.  Tenho uma inspiração, meu professor Ugo Werneck, ele é muito sábio e admiro a inteligência dele, ele possui doutorado em gastronomia. Na cozinha, o cara é quase um terrorista… Tudo e muito bem calculado, nada de desperdícios, tudo limpo. Essa é a inspiração que eu busco. Quero me formar, e ter mais a frente doutorado, e ser uma *gastróloga, que sempre terá as respostas da realidade de cada prato mundialmente falando e cultural.

  1. O que “todo mundo imagina”, mas não ocorre na cozinha profissional? O que “ninguém imagina” mais ocorre?
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Baião de dois feito por Andrenize

Todo estudante imagina que será chef de cozinha, na verdade “chef” e só um cargo normal, como engenheiro, administrador…  Imaginam que quando for para um hotel 6 estrelas ou restaurante vão direto para o fogão colocar em pratica o que aprendeu. E não. Não é assim, primeiro você é *Steward, lava a louça, lava o chão, pica os alimentos, corta os dedos, calos nas mãos, pele frágil…

O que ninguém imagina, mas ocorre, é que por mais que seja uma cozinha e tenha comida, na maioria das vezes o cozinheiro não come. Ou por falta de tempo, ou por ficar atarefado, ou por degustar tanto que se enjoa da comida.

Ninguém imagina que alimentos tão simples se tornam mágicos no prato e não acreditam simplesmente quando provam, pois sua técnica de *cocção faz muita diferença.  Ha disputa de cozinheiros para ver quem sobe primeiro para ser sub chef e querer mandar.

  1. O que te tira do sério, te desmotiva no ambiente de trabalho?

O que me desmotiva é não ter *mise en place, todo pré-preparo. O que me tira do sério é ver a cozinha um caos, bagunçada me irrita, assim como vê tudo sujo e/ou pessoas que fazem corpo mole.

  1. Já sentiu diferença no tratamento dos seus colegas por você ser mulher?

Sim a várias diferenças, porém difere de acordo com o local de trabalho. Já deram muito em cima (de mim) quando eu trabalhava em hotel, e em algumas tarefas também (sentia a diferença), por exemplo quando não aguentava pegar uma panela “meeega” grande o cozinheiro vinha e me dava aquela “mãozinha”. O machismo existe sim, e é muito chato lidar com isso, mas eu tento mostrar o meu melhor já que: “o cara se acha melhor por ser homem”. 

  1. Você acha que a ideia de que “Chefs são homens” e “cozinheiras são mulheres” existe no imaginário de muitas pessoas? Como você acha que essa ideia surgiu?

andrenizeeaspanelas.jpgEssa ideia é na verdade um mito. Chef pode ser mulher ou homem. Os homens que são machistas, não aceitam que uma mulher possa ser melhor, e que na verdade é.  Mulheres são mais rápidas e muito mais em ordem com o cumprimento de cada tarefa (risos).

Esse mito surgiu em 1756, desde a história dos padeiros, apesar de homens e mulheres fazerem pães em suas casas. Tendo relação também com a pré-história, quando o homem ia em busca da caça, e a mulher cuidava dos filhos ou plantava… Tem muito assunto dentro desse conceito, desse mito… Vários fatos do passado que contribuíram para essa cultura machista de hoje dentro das cozinhas ou em outros cargos..

  1. Existe diferença entre Chef e cozinheiro?

Chef é um cozinheiro que conseguiu o cargo “de chef”, então ele pode administrar as pessoas da/na cozinha como ele bem quiser, montar cardápio, retirar e colocar receitas.

Caso haja chef executivo, “ele manda o cardápio para o chef, e assim o chef para o sub chef, e o sub chef para o cozinheiro líder, e esse para os auxiliares (risos) ” , o cozinheiro executa as tarefas pedidas pelo seu sub chef. Isso vai depende do tamanho da cozinha, e quantas pessoas têm a sua volta.

Eu sou cozinheira (no local de trabalho) e acima de mim só tem o sub chef e abaixo de mim 2 estagiarias. (risos)… Cozinha de pequeno porte. E se fosse em um hotel eu seria a bactéria novata na brigada de cozinha mandada por todos.

  1. Qual a pior sensação que você já sentiu na cozinha? Em algum momento você já se questionou, se fez a escolha certa?

A pior sensação é com toda certeza é quando dá a hora da saída e chega aquele cliente chato, pede um prato, nesse prato ele pede um monte de frescura, “sem isso, sem aquilo, quero trocar isso por aquilo”. E ataca seriamente minha paciência.

Já me questionei se fiz a escolha certa sim, mas já trabalhei em outras profissões, tanto como vendedora ou na área da administrativa, e isso, me ataca muito mais os nervos, do que estar dentro de uma cozinha, onde eu me divirto com os cozinheiras e cozinheiros. Fogão não fala, panela também não, então não me irrita, gosto de montar pratos… É bom, legal e bonito (risos)…

  1. Qual a sensação mais compensadora de se fazer um prato?
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Arroz Maria Izabel feito por Andrenize.

Nossa, me sinto muito bem quando dizem: “Está lindo e gostoso”. A pouco tempo, lá onde eu trabalho, uma mesa com 6 pessoas, todos levantaram e bateram palmas para mim, no meio do salão, onde haviam outras mesas e outros clientes… Me elogiaram, fiquei muito feliz.

Outro dia, subiu (para o local onde fica a cozinha), um pai com o filho pequeno e curioso para conhecer a cozinha, ai o menino me viu e disse: “seu papa e muito gostoso” (risos)… E eu subi igual balão na Turquia. Criança não mente e quando gosta é porquê é bom mesmo rs…

  1. Qual a frase que você mais ouve enquanto cozinha?

“Prova aí, vê se tá bom de sal e pimenta.” Essa frase escuto mais de 100 vezes ao dia. (risos)

  1. Uma frase que tem um significado especial para seus dias na cozinha?

Nossa essa me pegou!!! “Pensar, planejar e executar.”                       

  1. Um conselho para quem escolheu essa área?

Não desista se errar, tudo se aprender se torna melhor. Viva com foco na cozinha e sempre seja realista. 

Glossário:   

*Mise en place – é uma expressão em francês, que significa “colocar no lugar”. É o ato de  deixar todos ingredientes e elementos utilizado na receita, ali do lado, prontos para serem utilizados.

*Gastróloga – Aquela que estuda ou é conhecedora da arte e da ciência culinária.

*Steward – aquele que conforme as normas do ambiente de trabalho, limpa, higieniza e organiza utensílios.

*cocção – Ato ou efeito de cozer, cozinhar.